Esse é uma versão incompleta, breve e sucinta sobre um pouco da história do Parque Augusta e da luta popular que o conquistou para a cidade.
É incompleta porque a história é muito grande e com a participação de muitas, mas muitas pessoas. Tantas pessoas que provavelmente seja impossível conseguir contar essa história sem deixar algo de fora.
É por isso que essa versão é apenas o início da construção do Memorial Parque Augusta, um memorial que será construído colaborativamente com a participação de todos aqueles que puderem ajudar a montarmos essa história e deixá-la registrada.
Nesse site vocês irão encontrar textos contando alguns dos marcos da conquista popular pelo Parque Augusta. Juntos aos textos há materiais multimídia relacionado a ele, de forma ilustrativa.
Esta versão inicia o Projeto Memorial Parque Augusta, que visa montar um site que funcione como um memorial colaborativo permanentemente aberto, onde qualquer pessoa possa publicar suas histórias junto à luta pelo Parque ou suas histórias nele, tanto as do passado quanto as que ainda estão para acontecer. Esse memorial virtual irá organizar todas essas histórias para que juntas formem a história do Parque Augusta.
Esse projeto conta com 2 fases:
Fase inicial - de 02/11 até 30/11
Acessando o link https://memorialparqueaugusta.com.br/colaborativo, você terá acesso às orientações para o envio de material que ajude a compor a próxima versão do site. O material compartilhado será publicado apenas na fase seguinte.
Ainda nessa primeira fase também estamos fazendo uma vaquinha coletiva para financiar esse projeto. Não precisamos de muito, mas quanto mais arrecadarmos, melhor será a estrutura que poderemos promover na fase final.
Fase final - a partir de janeiro de 2025
Uma nova versão será desenvolvida, agora incorporada com o material que as pessoas enviaram durante novembro de 2024.
Essa nova versão contará com uma história muito mais expandida, construída com o material colaborativo enviado. Na nova versão desse site, as pessoas poderão publicar diretamente suas histórias, fotos e vídeos de forma que a história do Parque Augusta seja contada por todos.
Iremos instalar no Parque Augusta uma exposição permanente, com totens que citam os principais marcos históricos e um QR Code que levará o visitante para acessar os conteúdos relacionados no site do Memorial.
Esse projeto é totalmente independente, sem nenhum fim lucrativo e realizado voluntariamente por ativistas.
A vaquinha coletiva tem o único e exclusivo intuito de viabilizarmos esse projeto e será a única forma de financiamento.
Todo o dinheiro arrecadado na vaquinha coletiva será convertido para esse projeto. A infraestrutura a ser implementada vai depender do valor arrecadado. Caso o valor seja superior às necessidades, o excedente será doado para a manutenção do Parque ou para a realização de um piquenique coletivo de comemoração.
Contribua com a vaquinha no link baixo.
https://www.kickante.com.br/crowdfunding/memorial-parque-augusta
Em 07 de dezembro de 1973 o decreto municipal número 10.766 fez averbar na matrícula do terreno uma cláusula que obrigava os proprietários a preservar a área verde e mantê-la aberta ao público. Foi assim que esse terreno começou a ser frequentado pela população e ganhou a função social de parque.
Foi por isso que alguns anos depois, quando os futuros proprietários tentaram construir prédios, a população se revoltou e não aceitou a desconfiguração desse parque que na prática já existia na vida das pessoas.
Em 1989 o Decreto Estadual número 30.443 declara a área patrimônio ambiental.
Em 2002, pela primeira vez surge uma previsão de municipalização do Parque Augusta, com a implementação do dispositivo municipal previsto no Plano Diretor Estratégico.
Em 2004 o CONPRESP faz o tombamento do bosque e remanescentes do Colégio Des Oiseaux,
Em 2006 surge o Projeto de Lei municipal 345-2006, para criação do Parque, que seria sancionado apenas em 2013 na Lei municipal nº 15941,
Em 2008 o terreno é objeto de um Decreto de Utilidade Pública (DUP), dando ao município 5 anos para desapropriação do terreno.
Foi quando começou a disputa acirrada entre a especulação imobiliária e os interesses da população.
Em agosto de 2013, tão logo encerrou-se o prazo do Decreto de Utilidade Pública (DUP) de 2008, as construtoras apresentaram um projeto de construção de prédios no terreno do parque. Mesmo com a sanção da Lei 15.941, que autorizava a construção do Parque Augusta, a prefeitura declarou que não tinha interesse em gastar dinheiro público para construí-lo.
Os movimentos populares começaram a ganhar força de mobilização e buscar meios de viabilizar o parque para a cidade. Muitas ações populares começaram a acontecer, como a festivais no Parque Augusta, fóruns de debates, aulas públicas, assembléias públicas, mutirões de limpeza e muitos outros tipos de mobilização. No intuito de boicotar a luta popular, as construtoras fecharam os portões, impedindo o acesso público, em violação ao decreto de 1973. Atitude que ensejou os ativistas a derrubarem um muro que estavam construindo para cercar o terreno.
Foi durante esses debates que surgiu pela primeira vez a proposta de Troca de Potencial Construtivo, o dispositivo que efetivamente foi usado para conquistar o parque mais de 4 anos depois, em 2018. Porém, em 2014 esse dispositivo não pôde ser utilizado, pois dependia da aceitação voluntária por parte das construtoras, que deixaram claro que não teriam nenhum interesse em disponibilizar esse terreno para a população, nem mesmo mediante uma negociação justa. Fariam apenas se obrigados pela lei.
Em 2014 a pressão popular conseguiu que o terreno fosse reconhecido como Zona Especial de Preservação Ambiental (ZEPAM) no Plano Diretor Estratégico e catalogado como Parque Municipal proposto, em planejamento.
Em janeiro de 2015 o movimento popular forçou a entrada no terreno e por lá permaneceu por 47 dias, garantindo o gozo de seu direito assegurado desde o decreto de 1973.
Durante 47 dias, assembléias populares eram organizadas semanalmente para alinhar as várias frentes de luta, uma prática que se manteve por longa data mesmo depois da desocupação do território. A ação ganhou grande repercussão e apoio da população em geral.
Durante a ocupação do Parque Augusta, uma série de debates foram promovidos, esse período ficou marcado como um grande momento de estudos e reflexões sobre estratégias para conquistar o parque e debates com a pergunta “que parque queremos?”, pois não tratava-se apenas de um terreno, o parque que a população desejava precisaria estar de acordo com os seus anseios.
Foi nesse momento de ocupação que a população conseguiu mobilizar o Ministério Público para acompanhar a situação. Posteriormente, a população conseguiu levar ao Ministério Público suas reivindicações e propostas de viabilização do parque sem custos para a cidade através do instrumento de Troca de Potencial Construtivo, conforme defendido desde 2014.
Em fevereiro de 2015, as construtoras conseguiram uma autorização judicial para fazer a reintegração de posse do terreno e mantê-lo fechado.
No dia seguinte, as construtoras começaram a instalar irregularmente tapumes para cercar o terreno e transmitir a ideia de que ali já era um canteiro de obras, em uma tentativa de impor uma narrativa falaciosa de que já teriam conquistado o direito de construir no local.
Nessa época o discurso das construtoras é que iriam construir algumas torres de prédios, mas doariam a área do Bosque para a cidade, como um parque nos fundos do seu quintal. Como o decreto de 1973 obriga o dono a manter e preservar a área verde, essa doação nada mais seria do que os proprietários se livrando dessa obrigação ao transferirem os custos para o município.
Quando começaram a instalar os tapumes que cercariam o parque, a população impediu fisicamente o processo utilizando seus corpos como bloqueio. Autoridades foram mobilizadas e foi confirmada a ilegalidade da ação das construtoras.
No mesmo dia as construtoras entraram com um processo visando autorização para instalar os tapumes, então a população permaneceu por 40 dias em vigília, para garantir que nenhuma obra irregular fosse executada.
Quando o processo teve seu resultado, as construtoras colocaram tapumes na parte interna do terreno, inclusive incorrendo em crimes ambientais que posteriormente se juntaram aos demais processos que garantiram a conquista do Parque Augusta para a cidade.
Após as pressões populares para intervenção do Ministério Público, alguns processos foram abertos contra as construtoras, incluindo alguns processos de crimes ambientais e um processo de danos morais coletivos à cidade, pelo fato das construtoras terem impedido a população de usufruir de seu direito de acesso àquela área verde, conforme garantido pela lei desde 1973.
Algumas tentativas de acordo foram feitas, o município chegou a oferecer o encerramento de todos os processos mais valores em dinheiro que variaram de 40 a 70 milhões pelo terreno, chegou a oferecer o encerramento dos processos e a troca do terreno por outro de mesmo valor em Pinheiros, mas as construtoras recusaram todas as propostas.
Durante esse período o movimento se manteve fortemente atuante, ainda realizando assembléias constantes, Fóruns de debate com convidados de diversos setores, aulas públicas, estudos sobre as possibilidades de viabilização, pedidos de tombamento e pesquisas arqueológicas, estudos sobre irregularidades nos projetos das construtoras etc.
Com o acesso ao parque impedido, desta vez legalmente por pedido judicial, os movimentos continuaram a se reunir, confraternizar e protestar em frente ao parque. O Piquenique no Asfalto foi um evento tradicional que durante anos levou ativistas a fazerem um piquenique comunitário literalmente no meio da rua Augusta, fechada para os carros com autorização da CET.
A Rua Também é Parque era o nome de outra atividade de natureza múltipla que acontecia na Augusta, em frente ao parque, de uma maneira mais guerrilheira, sem solicitação ao poder público.
Em 2018 aconteceu o julgamento do processo de danos morais coletivos à cidade. O Ministério Público pedia uma multa calculada por cada dia que as construtoras cercearam a população de seu direito de acesso àquela área verde, garantido desde 1973. O valor da multa foi calculado pelo Ministério Público de acordo com um outro processo que havia ferido o mesmo direito civil em uma outra área.
Conforme o julgamento foi chegando ao fim, ficou claro que as construtoras iriam perder. Foi somente na iminência de perder o processo que elas aceitaram um acordo baseado na proposta de 2014.
Para o encerramento dos processos jurídicos, as construtoras aceitaram voluntariamente a negociação do terreno pela Troca de Potencial Construtivo e se comprometeram a dar uma indenização de danos morais que foi efetivamente paga com as construtoras custeando e executando as obras do projeto do Parque Augusta e depositando um valor equivalente à manutenção do parque por dois anos.
De forma muito resumida, foi assim que um movimento popular muito amplo e diverso conseguiu se articular para conquistar o Parque Augusta sem que a cidade precisasse pagar nada nem pelo terreno nem pela implantação dos equipamentos e infraestrutura.
Desde 2013 o movimento popular já pensava que não bastava ser apenas um parque, precisaria ser um parque dentro de valores e princípios sócio-ambientais não excludentes e que pudessem contemplar a maior diversidade de pessoas de maneira igualitária, sem privilégios que não fossem igualmente acessíveis para todos. E também que contemplasse a preservação e regeneração da natureza.
O movimento popular fez diversas ações e campanhas para escutar da população “que parque queremos?”.
Como parte do acordo jurídico, o movimento popular conseguiu ter a garantia de que o projeto do parque seria conforme havia sido pensado pela população. Para garantir, o movimento começou a promover o desenho coletivo do que se tornaria o projeto arquitetônico do Parque Augusta, com ampla chamada para a participação popular.
Mais de 200 pessoas participaram desse processo, que começou com síntese dos desejos e princípios amplamente debatidos e devidamente registrados desde 2013 em assembléias, fóruns, aulas públicas e eventos diversos.
Em seguida, pensamos que tipo de estrutura e desenho arquitetônico seria adequado ao Parque. Depois, em vários encontros a população se reunia em torno da planta do terreno e esboçava como o parque deveria ser. Na última etapa, arquitetos militantes transformavam os esboços em desenhos técnicos. Processo finalizado, novas reuniões eram marcadas para revisar o resultado e esboçar novas mudanças, repetindo-se até o término do prazo.
No momento seguinte, a Secretaria do Verde e Meio Ambiente (SVMA) trabalhou em cima dos projetos que o movimento entregou, sintetizou-os e fez adequações técnicas necessárias, sempre em articulação com os movimentos, que exigiam mudanças executadas pela SVMA fossem mínimas, respeitando ao máximo os desejos da população.
Infelizmente a última etapa do projeto foi realizada por arquitetos contratados pelas construtoras, afinal ela teria que custear e executar as obras como forma de indenização. O resultado acabou desvirtuando parte da proposta coletiva, pois um dos princípios que toda a população sempre concordou era ter o mínimo de concreto e o máximo de verde. Todas as construções foram projetadas embaixo da arquibancada pelos ativistas, pois ela deveria ser construída como continuidade da topografia do terreno e esteticamente utilizando materiais que se misturassem à paisagem, “ocultando” as construções. A mesma situação ocorreu com os bebedouros e bancos do parque. Além de um “paisagismo” artificial que desconfigurou totalmente a natureza que estava ali presente. Um parque que deveria ser guiado por uma arquitetura naturalista acabou com muitos elementos do brutalismo. Houve poucas mudanças do projeto popular coletivo para a versão final, mas de impacto prejudicial por total insensibilidade e desrespeito com os desejos populares, uma característica egóica muito amadora para profissionais da área.
No dia 06 de novembro de 2021 ocorreu a Inauguração do Parque Augusta Municipalizado, o parque que na prática já existia agora reabre como parque público. A data foi marcada pela presença de políticos oportunistas que transformaram a cerimônia de abertura em um palanque eleitoral, na esmagadora maioria composto por pessoas que nunca tiveram nenhuma mobilização em defesa do parque.
Consequentemente, a data também foi marcada por protestos contra essa atitude que, além de desrespeitosa com os militantes, apresentou um discurso mentiroso tentando atribuir a esses políticos algum mérito pelo parque.
O auge da hipocrisia política foi acrescentar ao nome do parque o nome do falecido prefeito Bruno Covas, que efetivamente não fez nada pelo parque além de assinar um acordo que já havia sido firmado na gestão de seu antecessor, que também posicionou-se contrário ao Parque Augusta em favorecimento das construtoras, aceitando o acordo apenas quando as construtoras acenaram que tinham tal interesse.
Porém, a população em geral ignorou esse showzinho midiático e desde o primeiro dia começou a frequentar o parque pelo o que ele verdadeiramente é: a manifestação de um desejo e necessidade da cidade.
Desde sua abertura depois de municipalizado, o Parque Augusta recebe números recordes de visitação. Todos os dias uma ampla diversidade de pessoas com perfis muito distintos encontra no Parque Augusta um espaço no qual pode encontrar o seu lugar de acordo com suas preferências.
De longe é o maior número de visitantes por metro quadrado entre todos os parques de São Paulo e está entre os mais visitados em números absolutos. Isso mostra o quanto a cidade realmente estava carente de espaços como esse e o quão criminoso seria se a população tivesse sido privada do Parque Augusta.